Old Man's Journey é uma encantadora viagem pelas memórias de um velhinho

Jogos que visam contar histórias normalmente envolvem jornadas. O deslocamento físico se torna a mecânica básica e ações como andar, correr, pular, uma parte do vocabulário com o qual interagimos com o mundo. No entanto, videogames raramente valorizam o potencial transformador do simples ato de percorrer longas distâncias, literalmente deixando para trás aquilo que é observado e momentaneamente vivido, como road moviescostumam fazer. O ato de caminhar é uma poderosa metáfora para a vida, mas quando mecânicas entram na frente desta analogia, a ação perde muito de seu significado.

Old Man’s Journey é absolutamente lindo, e muito de sua beleza vem da sua abordagem poética da caminhada. Nele, somos um velhinho que recebe uma carta. A tristeza de seu olhar deixa claro a importância do há escrito ali. O falecimento de algum parente? Um filho doente? Sem nunca se comunicar com palavras, o jogo apenas nos dá o controle do senhor, que com mochila nas costas e bengala na mão, parte para uma jornada à pé por cenários bucólicos, que remetem à vida interiorana.

Como em um adventure aponte-e-clique, o senhor anda em direção ao local onde clicamos ou, nas versões para dispositivos móveis, tocamos com o dedo. No mundo bidimensional de Old Man’s Journey, qualquer caminho pode ser atravessado pelo personagem desde que eles se conectem, pouco importando se estão à frente ou atrás. Assim, devemos manipular o terreno para que eles se conectem com pontes, estradas ou outros morros, por vezes solucionando quebra-cabeças lógicos.

A arte em giz de Old Man’s Journey é de aquecer o coração, com suas múltiplas camadas de elementos visuais que harmonicamente compõem os cenários, dando a eles uma sensação de profundidade. Conforme abrimos caminho para o velhinho, pessoas, paisagens e situações despertam lembranças de seu passado e assim, pouco a pouco, passamos a entender sua história e a importância de sua jornada.

Essas lembranças transbordam emoções: descobrimos que o senhor de barba comprida e barriga saliente era um belo marinheiro. Testemunhamos a primeira troca de olhares com quem viria a ser sua futura esposa. E não apenas os momentos felizes que marcaram sua vida e seu relacionamento, mas também os tristes, que amargam dores e arrependimentos.

A belíssima trilha sonora, que traz o charme das melodias de Yann Tiersen, se adapta organicamente, captando a atmosfera de cada cena e intensificando os sentimentos tocados pelo jogo. Da mesma forma, seu visual, repleto de animações delicadas, cores e detalhes, nos dá a sensação de estar dentro de uma pintura em movimento.

Conforme o velhinho se aproxima de seu objetivo, alcançamos o presente de sua história, culminando em um encontro. E, tendo testemunhado tantos momentos importantes de sua vida, se torna impossível conter as lágrimas.

Old Man’s Journey se beneficia de um trabalho audiovisual primoroso, é verdade, mas a maneira como ele trata a caminhada, com pausas momentâneas para descanso e reflexão (quando nosso velhinho costuma lembrar de seu passado) é o que potencializa nossa relação com sua história, incrementando o significado de sua viagem e constantemente instigando nossa curiosidade pelo que está por vir e pelo que já foi.

Com uma mecânica simples aproveitada de forma inteligente, uma experiência breve e inspiradora e uma bela história de amor, Old Man’s Joruney é certamente um dos jogos mais encantadores de 2017. É também mais uma forma de nos convencer que jornadas nos videogames não precisam ser sempre épicas ou grandiosas. Que a força que move um velhinho de bengala a atravessar um país de encontro à sua redenção é a mesma que move um herói de capa e espada a salvar o mundo.

Old Man’s Journey está disponível para PC, Mac, Linux, iOS e Android. No Steam, ele custa R$ 15,99.