Análise - Moonlighter
Moonlighter é um daqueles jogos que não possuem pontos específicos que eu destacaria como ruins ou problemáticos, mas sim um título com diversas características que eu gostaria que fossem mais profundas. Não é que eu tenha saído insatisfeito, é só que ele tem mecânicas e ideias que não são aproveitadas em sua plenitude, o que me fez terminá-lo desejando que ele fosse um pouco mais do que ele é. Mas vamos por partes.
Desenvolvido pelo estúdio espanhol Digital Sun, Moonlighter se divide em dois grandes segmentos. No jogo controlamos um jovem chamado Will, que é dono de uma loja que se chama justamente Moonlighter. Quando ele não está no batente, Will explora calabouços que ficam nos arredores de sua cidade, descobertos em escavações. Tais calabouços, sem que ninguém saiba o porquê, são entradas mágicas, que levam aventureiros para ambientes diferentes a cada nova vez que eles entram lá. Mecanicamente, isso se traduz em fases geradas proceduralmente, com inimigos que ficam progressivamente mais fortes e que mudam de natureza completamente quando entramos em um novo calabouço.
Nosso protagonista tem motivos pessoais para querer se enfiar em tais lugares, relacionados a sua família, mas ele também tem uma razão mais prática e imediata: grana. Como esses calabouços são entradas para realidades distintas, os itens que podem ser obtidos lá são valiosos. Assim, tudo que é coletado pode ser trazido de volta à loja Moonlighter, para que seja posto à venda aos habitantes da cidade.
E é através disso que ocorre a segunda grande parte do título, em um minigame de comércio. Ao voltar com artefatos variados, que serão em sua maioria perdidos se você morrer durante a exploração, colocamos os itens em exposição e escolhemos qual será o valor de cada um deles. O divertido é que precisamos ficar de olho na reação dos compradores, que indicarão com suas expressões se o objeto está caro, tem o preço justo ou é uma pechincha. Muito diferente da realidade, trabalhar como vendedor é um momento mais relaxante, só pedindo reposição de estoque, que a gente ajuste os preços e impeça alguns ladrões de roubarem nossas coisas.
Essas duas partes da mecânica se comunicam porque, com o dinheiro obtido, podemos fazer melhorias na cidade, como trazer um ferreiro e uma bruxa ao vilarejo. Eles, por sua vez, oferecem serviços que nos deixam mais fortes para sobrevivermos com maior facilidade, aumentando nossa chance de passarmos pelos quatro calabouços para, quem sabe, abrir um famigerado quinto portal, façanha que nesse mundo nunca foi feita por ninguém.
E, como sabemos há décadas, esse tipo de loop funciona. Ele não só já se provou extremamente engajador em dungeon crawlers clássicos como Diablo, como também já tivemos exemplos de jogos mais próximos do que Moonlighter faz, com um sistema de gerenciamento de loja ou de melhoria de toda uma cidade, como em Recettear: An Item Shop’s Tale e Azure Dreams.
Mesmo já tendo tido casos similares em videogames, essa fórmula específica não aparece com muita frequência. E mesmo que esse fosse o caso, Moonlighter a executa muito bem. Ele me fisgou por horas a fio, em sua alternância entre um combate simples, porém prazeroso, e o minigame de vendas, cujos resultados permitiam que cada retorno aos calabouços fosse mais proveitoso. É também bastante gratificante melhorar suas armas e ver inimigos que davam trabalho sendo derrotados de repente com um golpe só.
O problema é que, apesar desse loop nunca deixar de funcionar, mais ou menos na metade da aventura as limitações do jogo começam a se tornam evidentes, em grande parte por ele parar de introduzir novas coisas. São apenas cinco melhorias que fazemos na cidade, sendo que uma delas, o Banco, não é nada útil. Mesmo depois de melhorado ao máximo, o vilarejo nunca parece vivo. Aparecem mais pessoas andando pelas ruas, mas fora uma figura ou outra, nenhum dos habitantes ou visitantes têm personalidade. É fácil notar que existem só três falas rotacionando entre todas as pessoas com quem conversamos. A artificialidade é muito óbvia.
Fora isso, podemos melhorar nossa loja, mas sua aparência do lado de fora nunca muda. Há até uma piada que faz referência a Doctor Who com isso, por ela ser maior do lado de dentro, mas de verdade só soou como uma solução meio preguiçosa. Realmente, em seu interior ela fica bem mais legal, com mais espaço para itens serem vendidos, decorações que dão bônus passivos e até mesmo uma ajudante, apesar dela nunca ser muito útil. Ela pode cuidar da loja para que exploremos os calabouços durante o dia, mas isso nunca foi necessário. Sempre os explorei à noite, até porque logo no início é dito que existem itens que só podem ser encontrados no período noturno. Supostamente os inimigos são mais poderosos nesse momento, mas isso nunca é um problema.
E foi mais ou menos nesse ponto também que ficou claro que Moonlighter tem uma variedade de coisas que não afetam em nada como você age. Além da ajudante e do ciclo de dia e noite, há toda uma mecânica de popularidade de itens, que cai se eles forem vendidos em abundância e sobe em outras circunstância. Na prática isso nunca é um fator que deve ser levado em conta e nunca interferiu no interesse dos compradores pelos meus itens, nem no preço que havia colocado neles.
Da mesma forma, depois de um tempo pessoas passam a encomendar itens específicos para serem trazidos dentro de um limite de tempo. Há uma recompensa em dinheiro e, normalmente, esses itens estão em calabouços que já deixamos para trás, o que significa que as coisas que podemos encontrar neles são menos valiosas. Não há nenhum motivo para se fazer essas caçadas, pois o dinheiro dado como recompensa é sempre muito pouco. Vale muito mais explorar o calabouço atual porque com os itens adquiridos nele consegue-se um lucro muito maior e mais facilmente, o que me fez ignorar completamente quase todas as encomendas.
O jogo também conta a passagem dos dias, havendo até mesmo um calendário que mostra em que dia do ano estamos. Fora ser usado para nos lembrar de pedidos feitos pelos habitantes não há nenhuma outra influência nisso. Não há eventos temporários na cidade, vendedores itinerantes, promoções relâmpago ou qualquer coisa do tipo. Não há também nenhuma forma de pressão, como uma hipoteca da loja que deve ser paga ou um montante de dinheiro para que os calabouços continuem abertos, por exemplo. Você pode fazer tudo no seu próprio ritmo, o que não é necessariamente ruim, mas parece deixar o jogo como um todo um pouco solto.
E é isso que eu quero dizer com o sentimento de que Moonlighter poderia ser mais do que ele é. Não é querer que ele fosse outra coisa, até mesmo porque ele agarrou minha atenção e eu praticamente não o larguei até terminá-lo. É só que, ao final, fica claro como muito do meu tempo com ele tornou-se uma atividade mecânica, na qual eu não tive que me adaptar nem fui surpreendido de qualquer forma. Após entender como ele funcionava, repetir o que eu tinha aprendido infinitamente, apenas melhorando minhas armas e armadura, me levou ao final sem problemas. Foi uma jornada bem agradável, mas uma sem eventos que a tenham tornado memorável.
Moonlighter
Desenvolvido pela Digital Sun
Distribuído pela 11 bit Studios
Disponível para PC, PS4 e Xbox One (futuramente será lançado para Switch)
Versão jogada: PC e PS4
Data de lançamento: 29/05/2018
A análise foi feita com uma cópia do jogo providenciada pela assessoria de imprensa